O resultado assinala a dissipação das expectativas fomentadas pelos partidos burgueses – também na Grécia – de que, com os mecanismos da União Europeia, os povos europeus prosperariam dentro de sua moldura.
O facto de que a saída de um país da União se tenha constituído em um debate tão intenso – ainda mais um país com a importância da Grã-Bretanha – deve-se, por um lado, às contradições internas da UE e às assimetrias de suas diversas economias, e por outro lado, à confrontação em curso entre os centros imperialistas, que se agudiza em condições de recessão económica. Tais fatores reforçam o assim chamado eurocepticismo e dão origem não somente a tendências secessionistas, mas também de tendências a modificações nas formas de administração política da UE e da Eurozona.
Os veículos do eurocepticismo reacionário são os partidos nacionalistas, racistas e fascistas, como o UK Independence Party (UKIP) de Nigel Farage, a Frente Nacional de Jean-Marie e Marine Le Pen em França, a “Alternativa para a Alemanha” e organizações similares na Áustria, Hungria e Grécia, como por exemplo o partido fascista Aurora Dourada, a Unidade Nacional de Giorgios Karatzaferis e outros. Mas o eurocepticismo também é expresso por partidos que se rotulam como esquerdistas, que criticam ou rejeitam a UE e o Euro, apoiam moedas nacionais e buscam outras alianças imperialistas, numa estratégia que opera dentro da moldura capitalista.
Essas contradições e antagonismos permeiam as classes burguesas de todos os Estados membros da União Europeia. Os processos económicos e políticos que terão lugar tanto na Grã-Bretanha como no resto da União e as negociações acerca da posição da burguesia britânica no dias seguintes ao referendo poderão levar a novos acordos temporários entre a UE e a Grã-Bretanha. O que se pode ter por certo é que enquanto houver a permanência da propriedade capitalista dos meios de produção e o poder burguês, tais desenvolvimentos virão acompanhados por novos sacrifícios dolorosos para a classe trabalhadora e as forças populares.
O resultado do referendo britânico expõe as outras forças políticas na Grécia, que glorificaram a participação do país na UE durante anos a fio, apresentando-a como um processo irreversível ou semeando ilusões acerca de uma “Europa mais justa e democrática”. Também expõe as forças que consideram que a moeda nacional seja uma panaceia que levará à prosperidade do povo. A Grã-Bretanha, com sua libra esterlina, adoptou as mesmas medidas antipovo e contra as classes trabalhadoras que tiveram lugar nos outros países da Eurozona. E continuará a adoptá-las fora da União Europeia, uma vez que seus monopólios seguirão tendo necessidade de ser competitivos e rentáveis.
É certo que nos próximos dias as vozes e as “lágrimas” multiplicar-se-ão, tanto por parte do governo SYRIZA-ANEL quanto dos outros partidos burgueses, sobre a “necessidade de restabelecer a UE”, sobre “o descaminho da UE e a necessidade do retorno às raízes” etc. Contudo, a UE, desde sua criação, foi e segue sendo uma aliança reacionária das classes burguesas da Europa capitalista, com o objetivo de sangrar à morte as classes trabalhadoras e saquear outros países do mundo, no quadro da competição com os demais centros do imperialismo. Não é, e não será, um arranjo permanente. A desigualdade e a competição capitalistas e a mudança na correlação de forças irá, mais cedo ou mais tarde, fazer aflorar as contradições, que não mais poderão ser superadas por compromissos frágeis e temporários. Simultaneamente, novos fenómenos e processos de formação de novas alianças reacionárias frutificarão no terreno do capitalismo.
Os interesses do povo grego, do povo britânico e de todos os povos da Europa não podem ser abrigados sob “falsas bandeiras”. Não podem ser postos sob as bandeiras dos diversos sectores da burguesia, que estabelecem suas escolhas e suas alianças de acordo com seus próprios interesses e com base na maior exploração possível dos trabalhadores. A necessária condenação da aliança predatória do capital e a luta pelo desmembramento de todos os países da União Europeia, para ser efetiva, tem de estar conectada à necessária derrubada do poder do capital pelo poder dos trabalhadores. A aliança social da classe trabalhadora e as demais camadas populares, o reagrupamento e o fortalecimento do movimento comunista internacional são precondições para pavimentar o caminho que levará a essa esperança.
24 de junho de 2016